Da redação
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por unanimidade, nesta quarta-feira (26), que a substituição temporária de chefe do poder Executivo nos seis meses anteriores ao pleito, em decorrência de decisão judicial não transitada em julgado, não conta como exercício de mandato para efeitos de reeleição. A decisão estabelece critérios importantes para casos em que vice-prefeitos, vice-governadores ou vice-presidentes assumem interinamente o cargo após afastamento do titular determinado pela Justiça.
Em outubro, os ministros já haviam decidido que o vice que substituísse o chefe do Poder Executivo por algum período nos seis meses anteriores à eleição, em razão do afastamento do titular pela Justiça, não está impedido de concorrer a um segundo mandato consecutivo. O julgamento desta quarta-feira estabeleceu os parâmetros da tese de repercussão geral do Tema 1.229, que deve ser seguida obrigatoriamente pelas outras instâncias da Justiça em todo o país.
Tese de repercussão geral estabelecida
A tese fixada pelo STF determina: “O exercício da chefia do Poder Executivo nos seis meses anteriores ao pleito em decorrência de decisão judicial não transitada em julgado não conta como exercício de um mandato para efeitos de reeleição”.
O julgamento tem origem no Recurso Extraordinário (RE) 1355228, apresentado por Allan Seixas de Sousa. Ele havia ocupado a prefeitura de Cachoeira dos Índios por apenas oito dias, entre 31 de agosto e 8 de setembro de 2016, período inferior a seis meses antes da eleição. Apesar do curtíssimo período no cargo, a Justiça Eleitoral indeferiu o registro de sua candidatura à reeleição em 2020, considerando que a substituição configuraria um terceiro mandato, vedado pela Constituição Federal.
De acordo com a Constituição, o presidente da República, os governadores, os prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos podem ser reeleitos apenas para um único mandato subsequente. A interpretação literal dessa norma levou ao indeferimento da candidatura de Sousa, gerando controvérsia jurídica.
O político argumentou que a substituição decorreu de uma decisão judicial que afastou o então prefeito e que o breve período de exercício não configuraria um terceiro mandato vedado pela Constituição Federal. Sousa sustentou ainda que não havia praticado nenhum ato relevante de gestão durante os oito dias à frente da prefeitura.
Substituição involuntária é o fundamento
Para o relator do recurso, ministro Nunes Marques, substituições por pequeno período em decorrência de decisão judicial, mesmo nos últimos seis meses do mandato, não devem ser consideradas para fins de inelegibilidade. Em seu entendimento, como a pessoa não teria sido a causadora da substituição, não seria possível indeferir sua candidatura apenas por ter cumprido uma decisão judicial de caráter involuntário.
Esse entendimento foi acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Luiz Fux e Gilmar Mendes, formando a maioria necessária para a decisão. O argumento central foi que penalizar alguém por cumprir uma determinação judicial seria desproporcional e contrário aos princípios da razoabilidade.
A discussão sobre prazos gerou diferentes posicionamentos entre os ministros. A proposta inicial do relator estabelecia que substituições por decisão judicial de até 90 dias, consecutivos ou alternados, não gerariam inelegibilidade. O ministro André Mendonça defendeu um prazo máximo mais restritivo de 15 dias, enquanto o ministro Alexandre de Moraes considerou que, sendo a substituição involuntária e decorrente de decisão judicial, ela poderia abranger todos os seis meses sem gerar impedimento.
Divergência sobre vedação constitucional
Em voto divergente, o ministro Flávio Dino destacou que o impedimento à reeleição nesses casos é determinação expressa da Constituição Federal e da Lei das Inelegibilidades (Lei Complementar 64/1990). Segundo o ministro, o legislador não fez distinção entre sucessão e substituição, criando um período de seis meses em que a pessoa que assume o cargo deve arcar com as consequências eleitorais dessa situação.
Dino foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia e pelos ministros Dias Toffoli e Edson Fachin, que também defenderam uma interpretação mais literal da norma constitucional. Para os divergentes, afrouxar as regras de inelegibilidade poderia abrir brechas para manobras políticas que contornem a limitação de mandatos.
Apesar da divergência, prevaleceu o entendimento de que substituições involuntárias e temporárias, especialmente quando decorrentes de decisões judiciais ainda não definitivas, não devem ser computadas como exercício de mandato. A decisão busca equilibrar a proteção democrática contra a perpetuação no poder com a necessidade de não penalizar quem cumpre determinações judiciais de forma legítima.



