Da Redação
Em decisão unânime, o plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabeleceu que casos envolvendo violência de gênero contra crianças e adolescentes do sexo feminino sejam preferencialmente julgados por varas especializadas quando disponíveis na comarca.
A modificação normativa, relatada pela conselheira Renata Gil, responde diretamente ao Tema Repetitivo 1.186 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em fevereiro deste ano, a corte superior consolidou o entendimento de que a condição de gênero feminino, por si só, é suficiente para a aplicação da Lei Maria da Penha, independentemente da idade da vítima.
“Firmou-se, assim, que a Lei Maria da Penha prevalece, nos pontos de eventual conflito, sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), quando configurada violência baseada em gênero”, destaca o relatório da conselheira.
Proteção Integral e Especialização Judicial
A relatora enfatizou que, embora o STJ tenha estabelecido a prevalência da Lei Maria da Penha em casos de violência de gênero, a corte não abordou especificamente situações onde existem varas especializadas em crimes contra crianças e adolescentes. Por essa razão, a nova resolução do CNJ busca preencher essa lacuna normativa.
“Essa interpretação precisa ser feita de forma integrada com os princípios constitucionais da proteção integral e da prioridade absoluta da infância, para evitar distorções que prejudiquem a organização da justiça e a efetividade dos direitos das crianças e adolescentes”, explicou Renata Gil.
Harmonização de Microssistemas de Proteção
A alteração foi analisada pelo Fórum Nacional da Infância e da Juventude (Foninj), coordenado pela própria conselheira relatora, e visa harmonizar diferentes marcos legais de proteção. A mudança busca integrar a Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha); a Lei nº 13.431/2017 (Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente); a Lei nº 14.344/2022 (Lei Henry Borel); e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
Impacto na Organização Judiciária
A decisão representa um avanço significativo na especialização do sistema judicial para casos que envolvem múltiplas vulnerabilidades – ser menor de idade e pertencer ao gênero feminino. Ao direcionar esses processos para varas especializadas em crimes contra crianças e adolescentes, quando disponíveis, o CNJ reconhece que a expertise específica dessas instâncias pode proporcionar melhor proteção às vítimas.
A resolução também reflete uma preocupação com a eficiência organizacional do Poder Judiciário, evitando conflitos de competência e garantindo que as especificidades dos casos envolvendo menores sejam adequadamente consideradas, mesmo quando aplicável a Lei Maria da Penha.
Proteção Ampliada
Esta mudança normativa consolida uma tendência de ampliar e especializar a proteção judicial oferecida a grupos em situação de dupla vulnerabilidade. No caso de meninas e adolescentes vítimas de violência doméstica, a decisão reconhece que a interseccionalidade entre idade e gênero demanda uma abordagem judicial especializada que considere ambos os aspectos.
A unanimidade da decisão no Plenário do CNJ demonstra o consenso entre os conselheiros sobre a necessidade de fortalecer os mecanismos de proteção para essa população especialmente vulnerável, garantindo que recebam a tutela jurisdicional mais adequada às suas necessidades específicas.