Da redação
A Advocacia-Geral da União (AGU) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que dê prioridade máxima ao julgamento das ações sobre a Lei de Igualdade Salarial entre homens e mulheres (Lei 14.611/2023), incluindo o tema na pauta de julgamentos com urgência. A manifestação, enviada na última sexta-feira (15/08), destaca que a definição da controvérsia é fundamental para garantir segurança jurídica à política pública que busca combater as desigualdades remuneratórias históricas no mercado de trabalho brasileiro.
Segundo a AGU, o julgamento célere é essencial considerando a relevância social e econômica da questão, que envolve a efetividade do direito fundamental à igualdade salarial entre os gêneros e a conformidade de políticas públicas com compromissos constitucionais e internacionais assumidos pelo Brasil.
Dispositivos da Lei Sob Análise do STF
A Lei 14.611/2023, conhecida como Lei de Igualdade Salarial, estabelece a obrigatoriedade de igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre homens e mulheres que exerçam funções equivalentes. A legislação também prevê que empresas com 100 ou mais funcionários devem fornecer relatórios semestrais de transparência salarial e de critérios remuneratórios, permitindo comparações objetivas entre a remuneração de homens e mulheres.
Atualmente, o STF analisa três ações relacionadas ao tema. Duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 7612 e 7631) contestam dispositivos da lei, além do decreto e da portaria do Ministério do Trabalho e Emprego que a regulamentaram (Decreto 11.795/2023 e Portaria 3.714/2023). As ações foram apresentadas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), Confederação Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo (CNC) e pelo Partido Novo.
Em contrapartida, uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 92 foi apresentada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), Confederação Nacional dos Metalúrgicos e Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias Têxtil, Couro, Calçados e Vestuário da Central Única dos Trabalhadores, defendendo a validade constitucional da legislação.
Defesa da Constitucionalidade e Compromissos Internacionais
A AGU defende a constitucionalidade da Lei de Igualdade Salarial, argumentando que a legislação é essencial para combater a persistente desigualdade salarial de gênero no Brasil. O órgão sustenta que a lei está alinhada com as normas constitucionais e com compromissos internacionais assumidos pelo país, incluindo a Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre igualdade de remuneração de 1951.
Além da convenção da OIT, o Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW) e comprometeu-se com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), especificamente aqueles relacionados à igualdade de gênero e ao trabalho decente.
A manifestação da AGU ressalta que esses compromissos internacionais reforçam a necessidade de políticas públicas efetivas para reduzir as disparidades salariais entre gêneros, tornando a Lei 14.611/2023 uma ferramenta essencial para o cumprimento dessas obrigações.
Dados sobre desigualdade salarial no Brasil
Estatísticas apresentadas pela AGU demonstram que a desigualdade salarial de gênero constitui um problema persistente e grave no Brasil. Segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), no quarto trimestre de 2023, as mulheres ganhavam 22,3% a menos que os homens em funções equivalentes.
A disparidade se torna ainda mais acentuada em posições de liderança: mulheres em cargos de diretoria ou gerência ganhavam, em média, 29,5% a menos que seus colegas homens no mesmo período.
O cenário brasileiro reflete uma tendência global preocupante. O Relatório Global de Desigualdade de Gênero 2023, do Fórum Econômico Mundial, que analisa continuamente a igualdade de gênero em 102 países desde 2006, identificou uma distância de 68,6% na remuneração entre os gêneros mundialmente.
Projeções desafiadoras para a paridade salarial
O relatório do Fórum Econômico Mundial apresenta uma projeção alarmante: na velocidade atual de progresso, seriam necessários 131 anos para alcançar a paridade salarial entre homens e mulheres no mundo.
As barreiras que impedem a igualdade salarial às mulheres, conforme os estudos citados pela AGU, incluem discriminação direta no ambiente de trabalho, assédio, dificuldade de conciliação entre trabalho e responsabilidades domésticas, e problemas relacionados à disponibilidade de creches e outros suportes para cuidado infantil.
Outra dado revelado pelo Dieese demonstra a desigualdade na distribuição de tarefas domésticas: no Brasil, em média, os homens gastam 11 horas semanais em atividades domésticas, enquanto as mulheres dedicam quase 17 horas semanais a essas mesmas tarefas.