A recente operação de busca e apreensão autorizada pelo Ministro Flávio Dino contra Mariangela Fialek, a “Tuca”, baseou-se fundamentalmente em uma série de oitivas realizadas pela Polícia Federal com deputados e um senador. Os relatos de seis parlamentares desenharam o mapa do funcionamento interno da Câmara, descrevendo um sistema centralizado de distribuição de verbas que ignorava a transparência e atropelava a autonomia das comissões temáticas. Os testemunhos apontam para uma estrutura de comando verticalizada, supostamente liderada pela antiga presidência da Casa, que utilizava a servidora investigada como operadora universal das emendas.
Glauber Braga e a fraude institucionalizada
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) forneceu um dos depoimentos mais detalhados sobre a mutação do mecanismo de emendas. Segundo ele, houve apenas uma mudança de nomenclatura para contornar as decisões do Supremo Tribunal Federal, mantendo-se a prática de centralização de recursos nas mãos de um pequeno grupo ligado à presidência da Câmara.
Braga relatou que o sistema de emendas de relator (RP9) migrou para as emendas de comissão, mas de forma viciada, onde os recursos não atendiam aos objetivos declarados publicamente pelas comissões, mas sim a interesses políticos paroquiais. Ele foi categórico ao afirmar à autoridade policial:
“Houve uma migração daquilo que era RP2 e RP9 para as emendas de comissão. E colocando isso de uma maneira fraudada e desobedecendo as decisões do STF.”
José Rocha e a pressão direta
O depoimento do deputado José Rocha (União-BA) foi crucial para vincular a servidora “Tuca” à presidência da Câmara. Rocha, que presidia uma das comissões, narrou ter recebido planilhas prontas, enviadas por Tuca, contendo valores milionários para estados como Alagoas, sem que houvesse identificação clara dos beneficiários ou dos autores das indicações.
O parlamentar descreveu um ambiente de coação, onde sua recusa em assinar cegamente os ofícios gerou atritos diretos com o deputado Arthur Lira. Ele confirmou que a servidora investigada era o canal único e obrigatório para o trâmite desses documentos não oficiais. Sua frase sintetiza o papel da operadora:
“Todos os ofícios e planilhas recebidas pela presidência da minha comissão vieram da presidência, enviado pela Tuca.”
Adriana Ventura e a recusa em ser “laranja”
A deputada Adriana Ventura (NOVO-SP) reforçou a tese de que as comissões funcionavam apenas como carimbadores de decisões tomadas “de cima”. Ela relatou aos investigadores sua indignação com a chegada de listas de emendas que nunca haviam sido deliberadas ou debatidas pelos membros do colegiado, transformando o processo legislativo em um teatro burocrático.
Ventura destacou que a falta de transparência era a regra e que questionar o destino do dinheiro era uma atitude isolada naquele ambiente. Ao descrever sua postura nas reuniões da comissão, ela declarou:
“E outros concordavam. E eu dizia: eu não sou laranja de ninguém.”
Fernando Marangoni e a onipresença de Tuca
O deputado Fernando Marangoni (União-SP) corroborou a posição de Mariangela Fialek como a figura central da administração orçamentária paralela. Embora tenha afirmado não ter convivência pessoal com a servidora, ele deixou claro que sua reputação e função eram de conhecimento notório entre os parlamentares.
Marangoni explicou que a atuação de Tuca não se limitava a um tipo específico de emenda, mas abrangia todo o espectro de negociações financeiras da Casa, consolidando o entendimento da PF sobre o poder que ela detinha. Ele resumiu:
“Ela que opera o orçamento ali. Nunca tive com ela, nunca vi, mas sei da existência da pessoa.”
Cleitinho e o mercado de emendas
O senador Cleitinho (Republicanos-MG) trouxe à tona a existência de um submundo de lobistas e intermediários que tentam capturar recursos de emendas. Ele relatou ter sido abordado nos corredores do Congresso por indivíduos desconhecidos que propunham “parcerias” estranhas envolvendo suas emendas parlamentares e ONGs, evidenciando a vulnerabilidade do sistema a fraudes.
Seu relato ilustra como a falta de critérios técnicos abre margem para abordagens criminosas. Sobre a proposta indecorosa que recebeu, ele citou:
“Nós temos uma ONG e a gente queria ver com o Senhor uma parceria de emenda.”
Dr. Francisco e a metodologia partidária
Por fim, o deputado Dr. Francisco (PT-PI) explicou como a metodologia de distribuição de emendas foi institucionalizada através das lideranças partidárias. Seu depoimento serviu para contextualizar que a prática de acolher sugestões vindas de bancadas, sem necessariamente passar pelo crivo técnico da comissão, tornou-se o procedimento padrão.
Ele descreveu a rotina administrativa que, segundo a investigação, permitiu a infiltração dos interesses do “orçamento secreto”. Sua declaração define o modus operandi:
“Nós adotamos a metodologia que já era praticada com as emendas de comissão, que era acolher as sugestões via as bancadas partidárias através de seus líderes partidários.”



