Entre os acusados, estão militares, ex-assessores de Bolsonaro e policiais.
Em decisão unânime, a 1° Turma do Supremo Tribunal Federal aceitou a denúncia pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado contra o chamado grupo 2 da trama golpista. Com isso, seis acusados se tornaram réus. São eles:
1- Fernando de Sousa Oliveira (delegado da Polícia Federal);
2- Filipe Garcia Martins Pereira (ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República);
3– Marcelo Costa Câmara (coronel da reserva do Exército e ex-assessor da Presidência da República);
4- Marília Ferreira de Alencar (delegada da Polícia Federal);
5- Mário Fernandes (general da reserva do Exército);
6- Silvinei Vasques (ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal).
Pela manhã, a 1° Turma já havia negado todas as preliminares alegadas pelas defesas dos denunciados. Entre elas, foram rejeitados os pedidos de impedimento ou suspeição contra os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin e o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet.
Veja aqui o argumento dos advogados de defesa.
Voto do relator
Ao se manifestar pelo recebimento da denúncia, na retomada do julgamento, nesta tarde (22/04), o relator, ministro Alexandre de Moraes, afirmou que a acusação da PGR expôs os fatos criminosos com o encadeamento das ações. E que foram fornecidos todos os todos os elementos necessários para que as defesas pudessem se defender.
“Não há inépcia da denúncia. Os fatos são descritos de forma satisfatória, de forma satisfatória, forma encadeada, forma lógica”, disse Moraes.
PRF
Moraes leu trechos da denúncia que demonstrou o uso da estrutura da Polícia Rodoviária Federal para impedir eleitores de votarem em Lula no segundo turno das eleições. O relator citou trocas de mensagens e a elaboração de relatórios, que confirmam a participação dos acusados nas ações.
Moraes ressaltou, ainda, que a PRF descumpriu a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que proibiu qualquer operação relacionada ao transporte gratuito ou não no segundo turno das eleições.
“A PRF, ignorando a decisão do TSE, montou as suas operações nesses municípios e isso só chegou à grande mídia quando dois senadores foram impedidos de chegar ao seu local de votação, porque pararam numa blitz também”.
Para o relator, a materialidade dos fatos está comprovada. A partir de agora, que o que deve ser apurado é a autoria ou as autorias das ações.
Plano Punhal Verde e Amarelo
Alexandre de Moraes lembrou que, em 9/11/22, segundo a PGR, o grupo finalizava as informações do plano Punhal Verde e Amarelo para neutralizar autoridades públicas e enfraquecer instituições. De acordo com a denúncia, a organização criminosa planejava agir com sequestros, prisões e mortes. O plano foi identificado no celular de Mario Fernandes e tramava contra a liberdade e a vida do presidente Lula, do vice, Geraldo Alckmin, e do próprio ministro Alexandre de Moraes.
Moraes também citou registro em áudio em que Fernandes e o ajudante de ordens Mauro Cid falam sobre o plano Punhal Verde e Amarelo. “Falei com ele [Jair Bolsonaro] agora, o plano é real!”
Milícias digitais
Moraes rebateu as alegações de que não poderia relatar o processo por ser vítima, relator e juiz ao mesmo tempo. Esclareceu que a denúncia não se refere a tentativa de homicídio, mas de ataques contra instituições. O relator ressaltou que se fossem denúncias de crimes contra a vida, seriam distribuídas a outro magistrado. “As milícias digitais continuam insistindo que eu sou o relator, o juiz e a vítima”, disse Moraes.
Segundo o ministro, seria muito fácil para o investigado passar a ameaçar o relator ou juiz para retirá-lo do processo.
“O investigado não escolhe o juiz. Não é o investigado que vai dizer qual juiz o julgará”, afirmou.
Decreto do golpe
Sobre a minuta do decreto de golpe, Alexandre de Moraes afirmou que a existência do documento já foi confirmada tanto pelos depoimentos quanto por Bolsonaro, que após ter virado réu, admitiu ter conhecimento da minuta em uma entrevista.
“Não há mais dúvida de que essa minuta, que a PGR imputa como minuta do golpe, passou de mão em mão, chegando inclusive ao presidente da república”, ressaltou Moraes.
Além disso, o relator lembrou que Mauro Cid relatou que a minuta foi entregue à Bolsonaro por Filipe Martins em 06/12/2022. E que na ocasião, o então presidente chegou a fazer ajustes no documento, submetendo a prisão apenas Moraes.
Em 07/12/22, segundo aponta a denúncia, o decreto foi apresentado a integrantes do alto escalão do governo federal e chefes das Forças Armadas no Palácio da Alvorada. O que foi confirmado pelo depoimento do então comandante do exército, Freire Gomes e por dados do celular de Mario Fernandes.
O ministro ressaltou que decisões do Supremo estabeleceram que nenhuma denúncia pode ser recebida só com base na colaboração.
“Há elementos que corroboram a delação. Não só o depoimento do comandante do exército, mas também dados armazenados no serviço de nuvem do general Mario Fernandes”.
8/1
Ao recomendar a aceitação da denúncia, Moraes destacou que foi comprovada a materialidade dos danos ao patrimônio provocados pelos atos de 8/1. O relator mostrou vídeos dos ataques e perguntou aos colegas: “O que aconteceria se um grupo armado invadisse a sua casa com o objetivo de afastar você e sua família com destruição e bombas, você pediria anistia para essas pessoas? Então por que a tentativa de quebra do estado democrático de direito é defendida por tanta gente?”
“Não foi passeio no parque”.
Moraes voltou a afastar a alegação de que os atos foram praticados por senhoras com bíblia na mão e reforçou que as imagens são muito importantes para que as pessoas não se esqueçam da gravidade dos atos antidemocráticos.
“Da gravidade que é tentar acabar com a democracia no Brasil. E que as pessoas de boa fé, as pessoas de bem, porque as pessoas e má fé, nessa vida é difícil de convencer.”
Acusados
Segundo Alexandre de Moraes, a PGR relatou as ações de cada integrante do chamado núcleo 2. Portanto, há justa causa para o recebimento da denúncia contra os seis acusados.
Fernando Souza – A denúncia narra sua adesão à organização criminosa que se iniciou no período eleitoral de 2022. Teria atuado em conjunto com a delegada Marília Alencar, então subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF, com a utilização das forças policiais para interferir nas eleições.
Marília Ferreira – responsável pela produção, análise e disseminação de informações estratégicas e por direcionar as ações policiais nas eleições de 2022. A delegada da Polícia Federal também foi acusada de comportamento omissivo e de não compartilhar informações relevantes para a segurança pública, contribuindo para o 8 de Janeiro.
Marcelo Costa Câmara – teria atuado em conjunto com Fernandes da intitulada operação Copa 2022, que tinha como objetivo monitorar autoridades, além de realizar a interlocução com as lideranças populares ligadas ao dia 8.1.2023. De acordo com a acusação, ele também é apontado como integrante do núcleo que alimentava Bolsonaro com informações com objetivo de consumar o suposto golpe de Estado, além de ataques ao sistema eleitoral.
Moraes lembrou que, em troca de mensagens, Câmara conversou com Mauro Cid sobre a localização de Moraes e de autoridades.
Filipe Martins – o ex- assessor de assuntos internacionais de Assuntos Internacionais da Presidência da República, foi o responsável pela leitura da chamada minuta do golpe numa reunião no Alvorada no dia 7 de dezembro.
Mario Fernandes – ficou responsável por coordenar as ações de monitoramento e neutralização de autoridades públicas. O general da reserva também foi o responsável por elaborar o chamado plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa a execução do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. O relator afirmou, ainda, que pesa contra Mario Fernandes a acusação de visitar os acampamentos em frente aos quartéis e incentivar os manifestantes.
Silvinei Vasques – o então diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal é acusado de determinar operações da PRF, durante o segundo turno das eleições de 2022, especialmente no nordeste, para impedirem os eleitores de voltarem. A estratégia, segundo a denúncia, teria sido traçada pelo então ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, em reunião realizada no dia 19/10/22. Segundo o relator, Silvinei desobedeceu a decisão do TSE que proibiu operações no segundo turno das eleições.
Votos dos outros ministros
Em menos de dois minutos, o ministro Flávio Dino acompanhou integralmente o relator. “Por ora considero que o eminente relator abordou o que interessa no caso: materialidade e autoria”, disse Dino.
O ministro Luiz Fux também acompanhou o entendimento de Moraes.
Ao votar para tornar os acusados réus na ação penal, a ministra Cármen Lúcia afirmou que as acusações são graves. Ela criticou advogados que se comportam como se fossem juristas.
“Ficou pouco ser advogado, todo mundo quer ser jurista”(…) “Jurista é Paulo Bonavides, Evandro Lins e Silva. Advogado tem que saber é defender seu cliente. Tem advogado que não sabe nem fazer uma procuração”.
O presidente da Turma, o ministro Cristiano Zanin, entendeu que estão presentes os requisitos para aceitar a denúncia e seguiu Moraes.
No fim da sessão, advogados dos réus pediram a reanálise das medidas cautelares. Alexandre de Moraes disse que vai analisar as medidas no tempo adequado.
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