Da Redação
Três jornalistas da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) conquistaram na Justiça do Trabalho o direito à jornada especial de cinco horas diárias, mesmo trabalhando em uma empresa que não atua no setor de comunicação. A vitória, confirmada por unanimidade pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho no último dia 9, representa um marco para a categoria ao estabelecer que a legislação trabalhista específica não pode ser flexibilizada por editais de concurso.
As profissionais – uma no Distrito Federal e duas no Maranhão – foram contratadas como analistas administrativas na área de jornalismo, com jornada prevista de 40 horas semanais nos respectivos editais. O que parecia ser apenas uma questão burocrática se transformou em uma longa disputa judicial que percorreu diferentes instâncias até chegar ao TST.
O embate jurídico
A empresa púbica argumentou que as atividades exercidas pelas jornalistas eram meramente de apoio administrativo, não constituindo trabalho privativo da categoria. Além disso, sustentou que os editais dos concursos tinham força de lei entre as partes, e que as candidatas, ao se inscreverem, concordaram tacitamente com as condições estabelecidas, incluindo a jornada de 40 horas. Para a Ebserh, o fato de não ser uma empresa do setor de comunicação a eximia de cumprir a legislação específica da categoria.
O caminho nas instâncias inferiores foi tortuoso e divergente. No Distrito Federal, tanto o juízo de primeira instância quanto o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região reconheceram inicialmente o direito da jornalista. O TRT-10 fundamentou sua decisão no Decreto-Lei 972/1969, que regulamenta a profissão de jornalista, identificando que as atividades exercidas se enquadravam perfeitamente na legislação.
Porém, a reviravolta veio na Quarta Turma do TST, que reformou a decisão regional. Para os ministros da Turma, empresas que não fossem do ramo jornalístico só precisariam respeitar a jornada especial se produzissem publicações destinadas à circulação externa – situação que não se aplicava à Ebserh.
Cenário diferente no Maranhão
No caso das jornalistas maranhenses, tanto o juízo de primeiro grau quanto o Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região negaram os pedidos, apoiando-se no argumento de que o edital do concurso teria força de lei entre as partes, não podendo ser modificado unilateralmente.
A mudança de rumo aconteceu quando a Primeira Turma do TST analisou os recursos. Baseando-se na Orientação Jurisprudencial (OJ) 407 da SDI-1, a Turma acolheu o pedido das trabalhadoras, estabelecendo que o fato de o empregador não ser uma empresa jornalística não afasta a aplicação da jornada reduzida.
A decisão definitiva
Com decisões conflitantes entre as Turmas do TST, os processos naturalmente chegaram à SDI-1 por meio de embargos. Foi nesta instância que a questão encontrou sua solução definitiva.
O ministro Aloysio Corrêa da Veiga, relator do caso da jornalista do DF, foi categórico ao destacar que o jornalismo transcende os limites das empresas tradicionalmente ligadas à comunicação. “Jornalistas também podem trabalhar em empresas não jornalísticas, que necessitam de divulgação interna e externa de notícias de seu interesse”, pontuou o magistrado.
Para Veiga, a natureza da atividade empresarial não é determinante: “Independentemente da atividade preponderante da empresa, se for reconhecida a condição de jornalista da empregada, esta tem direito à jornada reduzida de cinco horas”.
O ministro Breno Medeiros, relator dos embargos no caso do Maranhão, foi igualmente enfático sobre a hierarquia das normas. Embora reconhecesse que o edital previa expressamente a jornada de 40 horas, ele frisou que essa previsão não pode se sobrepor ao artigo 303 da CLT.
“Para o caso específico de jornalista, a legislação estabelece o limite máximo de cinco horas, sendo nula a regra que estabelece jornada superior ao definido em legislação”, concluiu Medeiros, estabelecendo um precedente claro sobre a supremacia da legislação trabalhista específica.
Impacto para a categoria
A decisão unânime da SDI-1 consolida uma jurisprudência que protege todos os profissionais da categoria que trabalham em empresas não jornalísticas, desde que exerçam atividades próprias da profissão. O precedente é especialmente relevante no contexto atual, em que muitas organizações públicas e privadas de diversos setores mantêm profissionais de jornalismo para cuidar de sua comunicação interna e externa. Hospitais, universidades, órgãos governamentais e empresas de diferentes segmentos frequentemente contratam jornalistas para assessorias de imprensa, comunicação institucional e produção de conteúdo.
A decisão do TST deixa claro que, independentemente do setor de atuação do empregador, os direitos trabalhistas específicos da categoria devem ser respeitados. Trata-se de uma garantia constitucional que não pode ser flexibilizada por instrumentos infralegais, ainda que sejam editais de concurso público.