Ministra Gleisi Hoffmann e base governista apontam que proposta favorece condenados por golpe de 8 de janeiro e afronta decisões do STF
O governo federal manifestou, em dois momentos distintos, sua posição contrária ao projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados que altera a dosimetria das penas aplicadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. A proposta foi classificada como um grave retrocesso na proteção da democracia brasileira.
Na véspera da votação, o Executivo informou que encaminharia voto contrário à medida. Após a aprovação, a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, endureceu o tom e afirmou que o projeto representa um atentado contra decisões históricas do STF e ameaça a independência das instituições.
Governo vê afronta ao STF e à democracia
Segundo a ministra, o projeto, apelidado de “projeto da dosimetria”, contraria o julgamento que condenou os chefes da tentativa de golpe de Estado ocorrida em 8 de janeiro, quando os prédios dos Três Poderes foram invadidos e depredados por manifestantes. Entre os condenados estão militares de alta patente e o ex-presidente Jair Bolsonaro, investigado por incitação aos atos.
“A proposta é um grave retrocesso. Enfraquece a legislação que protege a democracia e desafia uma decisão histórica do STF, que pela primeira vez puniu os líderes de um atentado institucional”, afirmou Gleisi.
Contradições na proposta
O governo critica o fato de o mesmo texto que endurece a progressão de pena para crimes comuns oferecer benefícios penais a condenados por crimes políticos, especialmente os ligados à tentativa de golpe. Para o Planalto, trata-se de um arranjo político que atende a interesses específicos da oposição e compromete o rigor da lei.
A ministra afirmou que “um arranjo político não pode fragilizar uma legislação tão importante para o país”. Gleisi também destacou que os atos de violência registrados durante a votação no plenário da Câmara, quando parlamentares, jornalistas e servidores foram agredidos verbalmente e fisicamente, demonstram o nível de tensão e radicalização envolvido no processo.
Base governista aponta chantagem política
Na avaliação de integrantes da base aliada, a aprovação do projeto foi resultado direto de um acordo entre lideranças da oposição e setores alinhados à família do ex-presidente Bolsonaro. O Planalto avalia que, ao ceder a essas pressões, o Congresso fragiliza a resposta institucional a atos antidemocráticos.
“Quem vai pagar o preço dessa chantagem é o país, nossas instituições e nossa democracia, mais uma vez ameaçada pelo golpismo”, afirmou a ministra, em nota divulgada após a votação.
O governo teme que a nova legislação seja usada para revisar condenações já impostas pelo STF ou para aliviar futuras sentenças, reduzindo o impacto punitivo das decisões do Supremo. A preocupação também se estende ao sinal político transmitido com a aprovação: uma mensagem de leniência com ações que atentam contra o Estado democrático de direito.
Julgamento ainda em curso no Supremo
Outro ponto destacado pela ministra é o fato de que o julgamento dos envolvidos nos atos golpistas ainda não foi concluído. Para o Executivo, a proposta interfere indevidamente em um processo judicial em andamento, subvertendo a separação entre os Poderes.
O projeto, que agora segue para apreciação no Senado, ainda poderá ser alvo de contestação por inconstitucionalidade, caso entre em vigor. O governo não descarta recorrer ao Supremo Tribunal Federal para barrar pontos considerados prejudiciais à ordem democrática.
O episódio reacende o debate sobre os limites entre o Legislativo e o Judiciário e sobre como o Brasil deve lidar, institucionalmente, com tentativas de ruptura democrática. A posição do governo é clara: preservar a democracia deve ser prioridade absoluta — e não moeda de troca em disputas políticas.



