Da Redação
O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação contra a União pedindo R$ 5 milhões de indenização por dano moral coletivo. O motivo: manifestações oficiais da Marinha do Brasil que desrespeitam a memória de João Cândido Felisberto, o líder da Revolta da Chibata, conhecido como “Almirante Negro”.
A ação, apresentada na Justiça Federal, quer impedir que a Marinha continue fazendo declarações ofensivas sobre João Cândido. O procurador Júlio Araujo, responsável pelo caso, argumenta que essas manifestações violam a Constituição Federal e a lei que concedeu anistia ao marinheiro em 2008.
O que levou à ação judicial
Em abril de 2024, o comandante da Marinha enviou uma carta à Câmara dos Deputados criticando um projeto de lei. O projeto propõe incluir o nome de João Cândido no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria.
Na carta, a Marinha chamou a Revolta da Chibata de “deplorável página da história nacional” e “fato opróbio”. Segundo o MPF, essas expressões atacam diretamente a memória de João Cândido e desrespeitam a anistia que ele recebeu por lei.
Marinha se recusa a mudar postura
O MPF já havia enviado uma recomendação pedindo que a Marinha parasse com as manifestações ofensivas. A resposta oficial da instituição foi negativa. A Marinha afirmou que não tomaria providências, alegando que suas declarações representam apenas sua “perspectiva histórica”.
Para o MPF, essa posição mostra que a Marinha pretende continuar com um discurso incompatível com a anistia legal concedida a João Cândido.
O direito à memória e a luta antirracista
O procurador destaca que a memória é um direito garantido pela Constituição. Proteger a memória de João Cândido está ligado ao combate ao racismo estrutural e à valorização das lutas da população negra por igualdade no Brasil.
O MPF argumenta que as declarações da Marinha vão além da liberdade de expressão. Como vêm de agentes públicos, elas contrariam normas constitucionais e compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em direitos humanos.
O que foi a Revolta da Chibata
Em 1910, os castigos físicos já haviam sido formalmente abolidos na Marinha desde 1889. Na prática, porém, os açoites continuavam. As principais vítimas eram marinheiros jovens, negros e pobres.
Em 22 de novembro de 1910, um marinheiro recebeu 250 chibatadas e desmaiou. O fato desencadeou a revolta liderada por João Cândido. Os rebeldes exigiam o fim dos castigos físicos, melhores condições de trabalho e alimentação adequada.
O movimento durou quatro dias e paralisou o Rio de Janeiro. O governo foi obrigado a negociar com os marinheiros. Como resultado direto da revolta, os castigos físicos foram finalmente abolidos na Marinha.
O que pede o MPF
A ação pede três coisas principais à Justiça Federal:
Primeiro, que declare a responsabilidade da União pelos danos causados. Segundo, que obrigue o poder público a parar de fazer manifestações ofensivas sobre João Cândido. Terceiro, que condene a União a pagar R$ 5 milhões por dano moral coletivo.
O valor da indenização deverá ser aplicado exclusivamente em projetos para valorizar a memória do líder da Revolta da Chibata. As regras serão estabelecidas pelo Conselho Nacional do Ministério Público e pelo Conselho Nacional de Justiça.


