O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a deflagração de uma operação da Polícia Federal que tem como alvos principais os deputados federais Carlos Jordy (PL-RJ) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). A decisão, assinada em 11 de dezembro de 2025, fundamenta-se em indícios de crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa envolvendo o uso indevido de cotas parlamentares. A investigação aponta para um esquema de locação de veículos com empresas de fachada para desviar recursos públicos em benefício próprio e de assessores.
O núcleo político e os assessores
A investigação da Polícia Federal identificou movimentações financeiras milionárias e incompatíveis com os rendimentos dos assessores ligados aos parlamentares. No centro das apurações está Adailton Oliveira Santos, assessor especial vinculado à liderança do PL.
Segundo o relatório, Adailton movimentou mais de R$ 11,4 milhões entre créditos e débitos, com grande concentração nos anos de 2023 e 2024. Ele é apontado como peça-chave na negociação dos contratos de locação e na intermediação de pagamentos “por fora”.
Outro nome central é Itamar de Souza Santana, secretário parlamentar do deputado Carlos Jordy. As análises financeiras detectaram que Itamar movimentou cerca de R$ 5,9 milhões, valor considerado incompatível com sua capacidade econômica. Diálogos interceptados mostram Itamar cobrando pagamentos de locação e mencionando repasses em espécie diretamente ao deputado.
O papel da empresa de fachada
O esquema operava principalmente através da empresa Harue Locação de Veículos Ltda ME, que posteriormente alterou o nome para Alfa Auto Car. A Polícia Federal constatou que a empresa teria sido dissolvida irregularmente e não funciona no endereço fiscal declarado.
Mesmo com indícios de inatividade, a empresa continuou recebendo pagamentos mensais das cotas parlamentares de Jordy e Sóstenes. Entre janeiro de 2020 e abril de 2024, a empresa recebeu R$ 214.000,00 de Carlos Jordy e R$ 192.400,00 de Sóstenes Cavalcante. A frota da empresa era composta por apenas cinco veículos, número discrepante em relação a outras locadoras do Rio de Janeiro.
A rede de operadores financeiros
Além dos assessores diretos, a decisão detalha a participação de um núcleo familiar e terceiros que atuavam na movimentação dos recursos. Florenice de Souza Santana, familiar de Itamar, movimentou quase R$ 4 milhões, com diversas transações sem identificação de origem ou destino.
O grupo familiar “Souza Santana”, composto por Itamar, Acivânio e Florenice, é apontado como operador das movimentações suspeitas envolvendo a locadora. Outros investigados, como Daniel Alex Fortunato e Georgenor Cavalcante Pinto, aparecem realizando transferências fracionadas para dificultar o rastreamento.
A prática, conhecida como “smurfing”, envolvia depósitos em dinheiro vivo em valores inferiores a R$ 10 mil para evitar alertas automáticos dos bancos. Há registros de repasses financeiros entre os assessores e terceiros sem justificativa econômica aparente.
Diálogos revelam o modus operandi
A decisão do ministro Flávio Dino destaca conversas de WhatsApp que evidenciam o controle dos assessores sobre os contratos. Em um dos diálogos, Adailton discute com Itamar a renovação de contratos e sugere valores que seriam pagos “por fora” pelo deputado Sóstenes.
Também foram identificadas cobranças relativas a diferenças de valores de aluguel que deveriam ser acertadas com os parlamentares. Há indícios de que veículos alugados com verba pública eram utilizados por familiares dos deputados, como a filha de Sóstenes Cavalcante.
A redução de um contrato de locação no Rio de Janeiro teria servido para aumentar o repasse à empresa Harue, indicando manipulação dos valores.
As medidas autorizadas
Diante da gravidade dos fatos, o STF determinou a busca e apreensão em endereços ligados aos investigados no Rio de Janeiro e em Brasília. Foi autorizado também o afastamento do sigilo bancário e fiscal de todos os envolvidos no período de maio de 2018 a dezembro de 2024.
O objetivo é rastrear o destino final dos recursos e confirmar a hipótese de que o dinheiro das cotas retornava aos parlamentares e seus assessores. A decisão permite ainda o compartilhamento das provas colhidas com a Receita Federal para apuração de irregularidades fiscais.
O compartilhamento com a Advocacia-Geral da União (AGU), no entanto, foi indeferido neste momento para preservar o sigilo das investigações em curso. A Polícia Federal terá um prazo de 45 dias para a execução e análise das medidas cautelares deferidas.


