Por Carolina Villela
O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a analisar em plenário virtual a Resolução 14/2012 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que proíbe a comercialização e importação de produtos derivados do tabaco com aditivos. O julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1348238 apresentado pela Cia. Sulamericana de Tabacos foi suspenso em fevereiro após pedido de vista do ministro Luiz Fux.
Até o momento, vence a divergência inaugurada pelo ministro Alexandre de Moraes, que votou favoravelmente à empresa, e foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux. Já os ministros Dias Toffoli (relator) e Edson Fachin rejeitaram o recurso.O julgamento termina no dia 24/06.
Constitucionalidade da Proteção à Saúde em Debate
O ministro relator Dias Toffoli fundamentou sua posição na obrigação constitucional do Estado de proteger a saúde pública, conforme estabelecido no artigo 196 da Constituição Federal. Para Toffoli, a Anvisa agiu dentro de suas competências ao criar a norma, respaldada por critérios técnicos e estudos científicos que demonstram os riscos dos aditivos em produtos fumígenos.
“A atuação da agência, como poder público, deve pautar-se pelo dever de proteção à saúde que emana da Constituição”, argumentou o ministro, reforçando que a regulamentação encontra amparo também na Convenção-Quadro sobre Controle e Uso do Tabaco da Organização Mundial da Saúde, aprovada pelo Congresso Nacional e promulgada pelo Presidente da República.
Toffoli propôs a seguinte tese:
“A RDC nº 14/2012 da Anvisa fundamenta-se em critérios e estudos técnicos, estando amparada no art. 196 da Constituição e nos arts. 7º, inciso XV, e 8º, § 1º, inciso X, da Lei nº 9.782/99 para proibir a importação e a comercialização de produtos fumígenos, derivados ou não do tabaco, que contenham aditivos usados para saborizar ou aromatizar os produtos”.
Questionamento sobre Excesso de Poder Regulatório
A divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes trouxe uma perspectiva crítica sobre os limites da atuação da Anvisa. O ministro argumentou que a agência desrespeitou duplamente o princípio da legalidade ao classificar genericamente os produtos com aditivos como de “risco iminente à saúde”, quando a legislação os define como produtos que “envolvem risco à saúde pública” – uma classificação menos restritiva.
“A partir da primeira ilegalidade, determinar a vedação absoluta de sua utilização, comercialização e importação, quando também a legislação expressamente autoriza, como regra, mas prevê diversas restrições”.
O ministro não questiona a legitimidade constitucional do Estado para restringir produtos nocivos à saúde, mas exige que tais restrições tenham fundamento idôneo, adequado e proporcional.
Para o ministro, embora seja indiscutível o consenso científico sobre os malefícios do tabaco, independentemente da presença de aditivos, a legislação vigente autoriza a importação e comercialização desses produtos com restrições, especialmente para maiores de 18 anos. “
“O ato normativo da Agência pretendeu estender essa proibição a todos, inclusive aos maiores de dezoito anos, para quem existe autorização legal. Ao órgão controlador é permitida a edição de restrições e não a proibição total do acesso ao consumo, pois é garantida por lei a própria opção daqueles que, maiores de idade, decidam-se pela escolha de “sabor e aroma” que mascarem as características sensíveis do cigarro”, concluiu o ministro.
Impacto Econômico e Jurídico da Decisão
A Companhia Sulamericana de Tabacos, autora do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1348238, contesta decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que validou a atuação da Anvisa. A empresa alega que a agência ultrapassou os limites de seu poder regulatório e que não há evidências de que a proibição possa efetivamente reduzir o consumo de tabaco ou minimizar danos à saúde dos usuários.
O caso ganhou repercussão geral reconhecida pelo STF (Tema 1252), o que significa que a decisão será aplicada a todos os casos similares em tramitação no país. A companhia lembra que o Supremo já analisou o tema na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4874, mas não houve quórum suficiente para invalidar a norma, justificando a necessidade de nova discussão plenária.
A resolução da Anvisa, em vigor desde 2012, proíbe a adição de substâncias que conferem sabor e aroma aos produtos de tabaco, como mentol, cravo e frutas, medida que afetou diretamente o portfólio de várias empresas do setor e alterou o perfil de consumo no mercado brasileiro.