Da redação
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quinta-feira (27) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973), que discute o reconhecimento da violação sistemática dos direitos fundamentais da população negra no Brasil. A ação, apresentada por sete partidos políticos – PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PV –, solicita medidas de reparação e a implementação de políticas públicas voltadas a essas pessoas. O relator, ministro Luiz Fux, julgou a ação parcialmente procedente, declarando o “estado de coisas inconstitucional” na superação das desigualdades raciais históricas.
O relator determinou a revisão do Plano de Ação Interministerial para a Promoção da Igualdade Racial (Apir) ou a elaboração de um novo plano nacional de combate ao racismo institucional em caráter autônomo, observadas diretrizes específicas. Fux foi seguido pelo ministro Flávio Dino, formando um placar de dois votos favoráveis.
Violação de direitos fundamentais
Os partidos argumentam que existe uma violação massiva de direitos fundamentais caracterizando um “estado de coisas inconstitucional”, fundamentado no racismo estrutural e institucional. A ação aponta para a necessidade de políticas de reparação pelas ações e omissões reiteradas do Estado brasileiro ao longo da história. O ministro Fux reconheceu a ineficiência do Estado brasileiro na garantia de direitos fundamentais da população mais humilde, majoritariamente negra do país.
As legendas destacam a violação de direitos essenciais como vida, saúde, segurança e alimentação digna. Um dos pontos críticos apresentados é o crescente aumento da letalidade de pessoas negras em decorrência de violência policial e institucional, fenômeno que demanda resposta urgente do poder público.
Plano Nacional de Combate ao Racismo
Fux iniciou seu voto afirmando que prefere descrever o tema como “racismo histórico”. Segundo o ministro, apesar de alguns avanços e políticas, o racismo estrutural prevalece no Brasil devido às constantes violações de preceitos fundamentais. O magistrado destacou que o STF tem adotado jurisprudência sobre o tema, reconhecendo o estado de coisas inconstitucional em ações envolvendo pessoas em situação de rua e a população carcerária.
O relator determinou a revisão do Plano de Ação Interministerial para a Promoção da Igualdade Racial (Apir) ou a elaboração de um novo plano nacional de combate ao racismo institucional em caráter autônomo, observadas diretrizes específicas. Fux foi seguido pelo ministro Flávio Dino, formando um placar de dois votos favoráveis. O julgamento foi suspenso e deve ser retomado nesta quinta-feira (27) com o voto
Omissão estatal sistemática
O ministro destacou a omissão estatal sistemática no enfrentamento às violações de direitos fundamentais. Fux citou decisões da justiça americana que alimentaram a segregação e o litígio estrutural.
Luiz Fux defendeu que deve haver uma política avançada e constante para que ocorra efetivamente a promoção da destruição do racismo histórico. Mesmo com as cotas raciais, o ministro ressaltou que os negros não ocupam vagas estratégicas em órgãos públicos e em universidades. Segundo ele, essa população “não tem essa chance”, pois a carência vem de muito tempo atrás.
“Dizer que não há racismo estrutural é negar a realidade”, afirmou o ministro durante seu voto. Segundo Fux, o STF está diante de um sensível processo estrutural, e a luta pela efetividade da Constituição é obrigação de todos os poderes, não apenas do Supremo Tribunal Federal.
Luiz Fux propôs a adoção de um plano nacional de enfrentamento ao racismo que estabelece 11 pontos estruturantes. Entre as principais diretrizes estão providências concretas para o combate ao racismo institucional, sobretudo em áreas relacionadas ao acesso à saúde, segurança alimentar, segurança pública e proteção da vida.
Onze diretrizes propostas
O plano inclui providências reparatórias em virtude de graves violações de direitos humanos em função da raça e cor, como a construção da memória e valorização do papel das populações discriminadas na formação étnico-cultural do país, no sistema educativo formal e no atendimento humanizado.
Outra diretriz prevê a revisão dos procedimentos de acesso via cotas às oportunidades de educação e emprego em função de raça-cor, com o objetivo de evitar a baixa efetividade em função de metodologias pouco efetivas ou que criam obstáculos desnecessários ao acesso. A proposta reconhece que apenas criar cotas não é suficiente se o acesso continua dificultado na prática.
O plano também determina a instituição de instrumentos de monitoramento e avaliação de cada elemento da política nacional de combate ao racismo que vier a ser formulada a partir da revisão proposta, com a definição de metas e prioridades mensuráveis. A criação de protocolo de atendimento de pessoas negras pelos órgãos do Poder Judiciário, pelo Ministério Público, pelas Defensorias Públicas e autoridades policiais para melhor acolhimento institucional e enfrentamento de disparidades raciais também consta entre as medidas.
Multas tributárias em discussão
Outro tema relevante na pauta é o (RE) 640452, que trata dos limites para aplicação de multas decorrentes de erros ou descumprimento de obrigações tributárias acessórias. O caso envolve as Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A – Eletronorte contra o Estado de Rondônia. O julgamento, inserido no Tema 487 de repercussão geral, definirá parâmetros para a imposição de penalidades relacionadas ao envio de dados ao Fisco, como a entrega de informações fiscais.
A decisão terá impacto significativo nas relações entre contribuintes e administração tributária, estabelecendo critérios claros para a aplicação de sanções por descumprimento de obrigações acessórias. O STF deve proclamar o resultado nesta sessão, encerrando a discussão iniciada há anos.
Benefícios fiscais para agrotóxicos
O tribunal também analisará as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 5553 e 7755, apresentadas pelo Partido Verde e PSOL. As ações questionam cláusulas do Convênio 100/1997 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e dispositivos do Decreto 7.660/2011, que reduziram em 60% a base de cálculo do ICMS sobre agrotóxicos e autorizaram estados a concederem isenção total do imposto.
Os partidos alegam que essas medidas afrontam o direito constitucional ao meio ambiente equilibrado e à saúde. A concessão de benefícios fiscais para produtos potencialmente nocivos contraria princípios ambientais e sanitários estabelecidos na Constituição Federal.
Relator propõe tributação para produtos nocivos
O ministro Edson Fachin, relator das ações, apresentou voto contrário aos incentivos fiscais ao setor de agrotóxicos. Para o magistrado, o centro da questão não é a proibição do uso desses produtos, mas a validade constitucional dos benefícios tributários que os favorecem. Fachin defende que a Constituição Federal impõe que o sistema tributário brasileiro seja “ambientalmente calibrado”, ou seja, que considere o impacto ambiental na definição das alíquotas.
Segundo o raciocínio apresentado pelo ministro, mercadorias ou processos produtivos mais nocivos ao meio ambiente devem ter tributação mais severa, e não o contrário. Fachin propôs a inconstitucionalidade das cláusulas primeira e terceira do Convênio Confaz 100/1997, da fixação de alíquota zero para agrotóxicos indicados no Decreto 11.158/2022 e do artigo 9º, parágrafo 1º, inciso XI, da Emenda Constitucional 132/2023. Caso a decisão seja acompanhada pelos demais ministros, não haverá efeitos retroativos, preservando os benefícios já concedidos no passado.



