Da redação
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou nesta terça-feira (2) uma ação penal contra o jogador de futebol Igor Aquino da Silva, conhecido profissionalmente como Igor Cariús, acusado de receber R$ 30 mil para provocar cartão amarelo em partida do Campeonato Brasileiro de 2022. O colegiado concluiu por maioria que a conduta do atleta, embora passível de punição na esfera esportiva, não configura crime, pois um único cartão amarelo não possui aptidão real para alterar ou falsear o resultado de uma competição. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 238757, com relatoria do ministro André Mendonça, prevalecendo a divergência aberta pelo ministro Gilmar Mendes e acompanhada pelo ministro Dias Toffoli.
Denúncia apontava participação em esquema de apostas
Segundo denúncia apresentada pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO), Igor Cariús teria aceitado a quantia para provocar um cartão amarelo no jogo entre Atlético Mineiro e Cuiabá, pela Série A do Campeonato Brasileiro de 2022. O caso fazia parte de um esquema de apostadores investigado na “Operação Penalidade Máxima”, que apurava manipulação de resultados em competições esportivas.
A denúncia foi recebida na primeira instância, e o atleta passou a responder pela suposta prática do delito previsto no artigo 198 da Lei Geral do Esporte. O dispositivo criminaliza a solicitação ou aceitação de vantagem para alterar ou falsear o resultado de competição esportiva, com pena de reclusão de dois a seis anos.
A defesa do jogador impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), buscando trancar a ação penal sob o argumento de que ele visou apenas lucro em apostas, sem influência no resultado do jogo. O pedido foi negado sucessivamente pelo TJ-GO e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), levando a defesa a recorrer ao Supremo Tribunal Federal.
Relator negou pedido em decisão individual
O ministro André Mendonça, relator do recurso, negou o pedido em decisão individual. Para ele, a intenção do atleta – se voltada ou não a alterar o resultado da competição – depende da análise das provas a serem produzidas no curso da instrução criminal, e não pode ser resolvida em sede de habeas corpus, remédio constitucional destinado a casos de flagrante ilegalidade.
Mendonça argumentou que a questão envolve análise aprofundada do conjunto probatório, incompatível com o rito sumário do habeas corpus. O ministro entendeu que caberia ao juízo de primeiro grau avaliar, durante a instrução processual, se a conduta do atleta se enquadrava no tipo penal descrito na Lei Geral do Esporte.
Contra a decisão do relator, a defesa apresentou agravo regimental, que foi julgado nesta terça-feira (2) pela Segunda Turma do STF. No julgamento colegiado, prevaleceu entendimento diverso ao do relator, reformando a decisão individual.
Gilmar Mendes considerou conduta atípica
No julgamento do agravo regimental, prevaleceu o voto divergente do ministro Gilmar Mendes, para quem a conduta do atleta é atípica, ou seja, não configura crime. Em seu entendimento, os fatos podem eventualmente levar à punição na esfera esportiva, mas não na seara penal.
Gilmar Mendes argumentou que um único cartão amarelo não possui aptidão real para alterar ou falsear o resultado da competição ou evento esportivo. Para caracterizar o crime previsto na Lei Geral do Esporte, seria necessário que a conduta tivesse potencial concreto de interferir no placar final da partida ou na classificação das equipes.
O ministro ressaltou que cartões amarelos, por si só, não determinam vencedores ou derrotados em uma partida de futebol, diferentemente de condutas como marcar gol contra, entregar pênaltis deliberadamente ou expulsões estratégicas que deixam a equipe em desvantagem numérica decisiva.
Decisão reconhece competência de tribunais esportivos
O voto divergente foi acompanhado pelo ministro Dias Toffoli, formando maioria na Segunda Turma. A decisão reconhece que condutas antidesportivas devem ser julgadas prioritariamente pelos tribunais de justiça desportiva, instâncias especializadas em infrações às regras do esporte.
Os ministros Nunes Marques e Luiz Fux não participaram, justificadamente, da sessão de julgamento. Com a decisão, a ação penal contra o jogador foi trancada, encerrando o processo criminal no âmbito da Justiça comum.



