Enquanto permanece foragido nos Estados Unidos, o deputado federal condenado a 16 anos por trama golpista teve salário bloqueado, emendas suspensas e foi demitido da Polícia Federal
Da Redação
O caso do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) ganhou novos capítulos nas últimas semanas, com uma série de medidas judiciais e administrativas que agravam sua situação como foragido da Justiça brasileira. Condenado a 16 anos de prisão por participação na trama golpista, o parlamentar foi flagrado em Miami, nos Estados Unidos, desencadeando uma sequência de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do governo federal.
Prisão preventiva e flagrante em Miami
Em 21 de novembro, o ministro Alexandre de Moraes decretou a prisão preventiva de Ramagem após o site PlatôBR divulgar imagens do deputado entrando em um condomínio de luxo em North Miami. A descoberta surpreendeu as autoridades já que durante a investigação Ramagem foi proibido de sair do país e teve que entregar todos os passaportes nacionais e estrangeiros.
Investigadores da Polícia Federal consultados pela imprensa apuram que o parlamentar não está no país desde setembro e que se deslocou até Boa Vista (RR). As suspeitas indicam que ele teria deixado o Brasil pela Venezuela ou Guiana Francesa antes de seguir para os Estados Unidos.
A Câmara dos Deputados informou que não foi comunicada sobre a viagem e que o deputado apresentou atestados médicos cobrindo os períodos de 9 de setembro a 8 de outubro e de 13 de outubro a 12 de dezembro. Paradoxalmente, Ramagem apareceu registrado em votações presenciais na Câmara durante esse período, o que levanta dúvidas sobre a veracidade dos atestados.
Demissão da Polícia Federal
Em 3 de dezembro, o Ministério da Justiça formalizou a demissão de Alexandre Ramagem dos quadros da Polícia Federal, em cumprimento à decisão da Primeira Turma do STF. A medida, assinada pelo ministro Ricardo Lewandowski, foi publicada no Diário Oficial da União e retira definitivamente o ex-diretor da Abin do quadro de delegados da corporação.
A demissão ocorre como parte da pena imposta pelo STF, que além da condenação prisional, determinou a perda dos cargos públicos. Ramagem, que era delegado de carreira, estava licenciado para exercer funções políticas, mas agora perde permanentemente o vínculo com a instituição.
Bloqueio de salário e emendas parlamentares
A Câmara dos Deputados bloqueou o salário de Ramagem, atualmente em R$ 46,3 mil, cumprindo determinação do ministro Alexandre de Moraes. A medida foi tomada após o STF encerrar a fase de recursos e ordenar a execução imediata da pena.
Em uma decisão ainda mais impactante, o ministro Flávio Dino determinou em 4 de dezembro a proibição imediata de o governo federal receber, analisar ou pagar qualquer emenda parlamentar apresentada por Ramagem. O deputado havia destinado R$ 40,2 milhões em emendas ao Orçamento de 2026.
Na decisão, Dino afirmou que parlamentares sediados no exterior não cumprem deveres mínimos de representação e que a destinação de recursos por emendas exige presença institucional. A medida, que também atinge o deputado Eduardo Bolsonaro, estabelece um precedente sobre os limites do “mandato à distância”.
Defesa apresenta novos recursos
Em 3 de dezembro, a defesa de Ramagem apresentou novo recurso contra a condenação, reiterando pedido de absolvição e alegando que ele tem direito aos chamados embargos infringentes. Os advogados sustentam que o parlamentar não participou da trama golpista e que a condenação não tem amparo no conjunto probatório.
No recurso, a defesa argumenta que “Alexandre Ramagem jamais integrou qualquer organização criminosa que seria vocacionada à deposição do Estado Democrático de Direito”, destacando que seu propósito era integrar o Poder Legislativo pela via democrática.
Condenação e crimes imputados
Ramagem foi condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e participação em organização criminosa armada. Segundo a acusação, durante o governo Bolsonaro, quando chefiou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), ele teria usado sua posição para minar a confiança no sistema eleitoral brasileiro.
De acordo com a PGR, Ramagem teria usado a estrutura da Abin em favor dos planos golpistas, comandando uma “Abin paralela” que monitoraria adversários e críticos do governo Bolsonaro, além de produzir informações falsas e ataques virtuais.
Ramagem foi o único réu no julgamento acusado e condenado por três crimes, e não cinco. Por ser deputado federal, ele não respondeu às acusações de danos contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado, relacionadas aos ataques de 8 de janeiro de 2023. Devido à imunidade parlamentar, ele só poderia ser acusado de crimes cometidos antes da diplomação de deputado, o que ocorreu em dezembro de 2022.
Próximos passos e possível extradição
Com a confirmação da fuga, é provável que o nome de Ramagem seja incluído na difusão vermelha da Interpol, mecanismo utilizado para alertar autoridades internacionais sobre pessoas procuradas pela Justiça. Essa medida já foi adotada contra outros acusados de envolvimento na mesma trama, como a deputada Carla Zambelli (PL-SP), que se refugiou na Itália.
A situação de Ramagem se torna cada vez mais complexa, com múltiplas frentes de ação judicial e administrativa convergindo contra o deputado. Enquanto permanece foragido em Miami, ele enfrenta o bloqueio de recursos, a perda de cargo público e a perspectiva de que as autoridades americanas possam cooperar com o Brasil para sua eventual extradição.
O PSOL, que tem pressionado pela prisão de Ramagem desde a revelação de sua fuga, continua acompanhando o caso e já anunciou que recorrerá de qualquer tentativa da Câmara de proteger o parlamentar através da imunidade. O caso estabelece precedentes importantes sobre os limites da imunidade parlamentar e das responsabilidades de representantes eleitos condenados por crimes contra o Estado Democrático de Direito.


