Por Carolina Villela
O pastor Silas Malafaia foi alvo de busca e apreensão nesta quarta-feira (20) ao desembarcar no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, em operação da Polícia Federal autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). A ação ocorre no âmbito da investigação (Pet) 14129 que apura suposta tentativa de coação no curso do processo e obstrução da Justiça em articulação com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Além da apreensão de celulares, Malafaia teve outras medidas cautelares impostas, incluindo proibição de deixar o país e de manter contato com investigados pela suposta tentativa de golpe de Estado, especificamente com Jair Bolsonaro e o deputado Eduardo Bolsonaro. O pastor deve entregar todos os passaportes em até 24 horas e está sendo ouvido pelos investigadores no aeroporto carioca.
Ameaças aos ministros do STF e articulação após tarifas americanas
A investigação da Polícia Federal identificou uma série de diálogos entre Jair Bolsonaro e Silas Malafaia a partir de 9 de julho de 2025, data do anúncio da imposição de tarifas ao Brasil pelos Estados Unidos. Segundo o inquérito, as conversas demonstram tentativa coordenada de usar a pressão internacional para coagir o STF e explorar a crise diplomática.
Em 10 de julho, às 13h01, Malafaia enviou mensagem para Bolsonaro afirmando que “a próxima retaliação vai ser contra ministros do STF e suas famílias”.
“PRESIDENTE! Você voltou para o jogo. Podem usar bravatas aqui, vão ter que sentar na mesa para negociar. Você é o cerne da questão. Quem é o Brasil para peitar os EUA? Mico contra um gorila. O vídeo que vou postar daqui a pouco eu vou ao cerne da questão. A próxima retaliação vai ser contra ministros do STF e suas famílias. Vão dobrar a aposta apoiando o ditador? DUVIDO!’’, disse Malafaia.
Às 13h39 do mesmo dia, o pastor enviou vídeo que posteriormente seria divulgado em redes sociais contendo ataques às instituições brasileiras, ameaças aos ministros do STF, ao Procurador-Geral da República e ao Diretor-Geral da Polícia Federal, com nítida intenção de coagir as
autoridades públicas, bem como tentar obstruir as ações penais sobre a tentativa de golpe de 8/1/2023, segundo a PF.
Estratégia de chantagem institucional revelada
Em 11 de julho, às 17h20, Malafaia enviou mensagem alertando sobre possíveis consequências políticas se o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, tivesse ido à embaixada americana a pedido de Bolsonaro. O pastor sugeriu que Donald Trump poderia “refrescar para Lula” sem resolver a questão de Bolsonaro.
Na mesma mensagem, Malafaia deixou explícita a estratégia: “O endereço para acordo é o STF, são os únicos que podem pressionar Lula e arrumar uma saída honrosa para eles que estão com o rabo na reta”.
Em 13 de julho, às 9h32min, Silas Malafaia escreveu novas orientações para o posicionamento de Bolsonaro em relação à carta escrita pelo presidente dos Estados Unidos e publicada no dia 9 de julho anunciando a tarifa de 50% sobre a exportação de produtos brasileiros, afirmando a necessidade de condicionar a suspensão das sanções alfandegárias à “uma anistia ampla e total” e reiterando ameaças ao Supremo:
“Tem que pressionar o STF dizendo que se houver uma anistia ampla e total, a tarifa vai ser suspensa. Ainda pode usar o seguinte argumento: NÃO QUEREMOS VER SANÇÕES CONTRA MINISTROS DO STF E SUAS FAMÍLIAS. Eles se cagão (sic) disso! A questão da tarifa é justiça e liberdade, não econômica. TRAZ O DISCURSO PARA ISSO! (…)”.
Os investigadores identificaram um áudio enviado a Bolsonaro no mesmo dia, às 9h41, em que Malafaia insiste na obtenção da anistia em troca do fim das sanções tarifárias: “É só resolver a questão da ANISTIA e isso acaba” e insinuando sanções aos Ministros do STF ao afirmar: “Eu não quero ver os ministros do STF nem suas famílias retaliadas. É só resolver a questão da ANISTIA”:
Papel de liderança nas ações criminosas
A investigação aponta que Malafaia exercia papel de liderança na articulação das ações contra o STF. Em 15 de julho, às 12h26, o pastor insistiu para que Bolsonaro gravasse vídeo: “Abre a boca! Líder da direção ao povo, povo é levado por outros quando líder se cala. SÓ O QUE VIRALIZA É VIDEO!”
Na sequência, às 13h34min, o pastor envia novas mensagens a Bolsonaro, insistindo na gravação do vídeo, ressaltando mais uma vez, segundo a PF, que os objetivos das condutas é a coação das autoridades brasileiras, afirmando que “Tem que juntar a taxa com a questão da anistia”:
Na mesma conversa, Malafaia revelou estratégia de difusão que contaria com participação de Eduardo Bolsonaro: “Faça o vídeo eu faço a versão em inglês por IA, seu filho faz chegar na mão de Trump, tem contato com assessores que fala toda hora com ele. Trump quer ver também uma atitude sua.”
Campanha orquestrada contra ministros
A Polícia Federal caracterizou as condutas como parte de “campanha criminosa orquestrada” destinada à criação, produção e divulgação de ataques aos ministros do STF. Os investigadores apontam que Malafaia apenas sugeria as ações, mas influenciava diretamente Bolsonaro, resultando em ações concretas nas redes sociais.
Os investigadores destacam que há “fortes evidências” de que o pastor atuava na construção de uma campanha criminosa orquestrada, destinada à criação, produção e divulgação de ataques a Ministros do STF, em contexto similar às investigações do inquérito das fake news. Segundo o relatório, as postagens eram previamente acordadas entre Malafaia e Bolsonaro.
O documento da PF indica ainda, risco de “dano grave ou de difícil reparação” em razão dos indícios de cometimento de crimes gravíssimos, justificando as medidas cautelares impostas pelo ministro Alexandre de Moraes.