Por Carolina Villela
O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu as audiências de oitiva desta semana com os depoimentos de testemunhas do ex-ministro da Justiça Anderson Torres e do ex-presidente Jair Bolsonaro(PL) na ação penal (AP) 2668 que investiga a tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Durante duas sessões conduzidas pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, oito pessoas foram ouvidas e negaram conhecimento sobre planos golpistas ou ruptura democrática.
Acampamento “esvaziado”
O general Gustavo Dutra, ex-comandante militar do Planalto, antecipou seu depoimento, previsto para a próxima segunda-feira(2). Ao depor nesta tarde, ele confirmou sua participação na reunião de 6 de janeiro, classificando-a como “cafezinho de cortesia”.
O general disse que apresentou fotos para Anderson Torres, ex-secretário de Segurança Pública do DF, demonstrando que o acampamento estava “esvaziado” e que a maior parte dos manifestantes mobilizados eram pessoas em situação de rua.
Dutra disse se lembrar que, na ocasião, Torres teria dito que viajaria naquela noite. O ex-comandante militar do Planalto também afirmou que convidou a secretária de Desenvolvimento Social do DF para prestar assistência às pessoas em situação de rua que se encontravam no acampamento.
Testemunha nega conversas ou consultas jurídicas sobre plano golpista
Renato de Lima França, ex-subchefe para Assuntos Jurídicos do governo Bolsonaro, negou qualquer discussão sobre minuta de estado de exceção ou solicitação de estudos sobre mecanismos excepcionais.
França, que atuava como assessor jurídico direto do presidente, afirmou nunca ter sido consultado sobre o artigo 142 da Constituição, Garantia da Lei e da Ordem (GLO) ou estado de defesa. Em seu depoimento, negou consultas sobre mecanismos para anular as eleições.
Em um depoimento rápido, Jonathas Assunção Salvador Nery, ex-secretário-executivo da Casa Civil, encerrou as oitivas dessa sexta-feira afirmando que a transição de governo “aconteceu da forma mais colaborativa possível” desde o momento em que foi anunciada.
Tarcísio nega conversas sobre ruptura democrática
Pela manhã, o primeiro a ser ouvido, Tarcísio de Freitas, ex-ministro de Infraestrutura, afirmou que o ex-presidente Bolsonaro “jamais mencionou qualquer tentativa de ruptura” durante os encontros que mantiveram em novembro e dezembro de 2022.
“Nesse período em que estive com o presidente nessa reta final, nas visitas que eu fiz, ele jamais tocou nesse assunto e não mencionou qualquer tipo de ruptura. Encontrei um presidente triste, resignado. Esse assunto nunca veio à pauta”, afirmou Tarcísio
Segundo o relato do governador paulista, Bolsonaro estava abalado após a derrota eleitoral, visivelmente “triste” e doente. O único comentário que ouvia do então presidente era o lamento pela derrota e a preocupação de que “a coisa desandasse” no país.
Tarcísio lembrou que o governo havia enfrentado crises graves como a tragédia de Brumadinho, a pandemia de Covid-19, a crise hídrica e os impactos da guerra na Ucrânia, o que justificaria a “preocupação com o futuro do país” demonstrada pelo ex-presidente.
Ex-ministro da Casa Civil conduziu transição
Ciro Nogueira, responsável por conduzir o processo de transição governamental, reforçou a versão de que tudo ocorreu dentro da normalidade institucional. O ex-ministro negou ter recebido de Anderson Torres qualquer documento relacionado a planos golpistas, descrevendo o ex-ministro da Justiça como “zeloso, competente” e um profissional que “sempre interagia”.
O senador confirmou que Bolsonaro ficou “deprimido” após as eleições, desenvolveu erisipela e se recolheu no Palácio da Alvorada, de onde passou a despachar. Segundo Nogueira, ele tinha autonomia total para conduzir a transição e informava o presidente sobre situações que surgiam durante o processo e nunca quis impedir a posse de Lula.
““Foi tudo dentro da normalidade e o presidente em momento nenhum quis obstaculizar”, afirmou.
“Em hipótese nenhuma, nunca aconteceu isso”, enfatizou Ciro ao negar ter conversado com Bolsonaro sobre qualquer ruptura do Estado Democrático de Direito, reiterando que a única orientação presidencial era conduzir adequadamente a transição.
CPI dos atos de 8 de janeiro não indiciou Anderson Torres
João Hermeto, deputado distrital que relatou a CPI dos atos de 8 de janeiro na Câmara Legislativa do Distrito Federal, afirmou que a comissão optou por indiciar apenas os financiadores dos atos, por não ter encontrado elementos que comprovassem a participação de Anderson Torres, ex-secretário de Segurança Pública do DF.
Segundo o parlamentar, a decisão foi baseada em uma reunião realizada em 6 de janeiro de 2023, na qual o general Dutra, ex-comandante militar do Planalto, teria mostrado uma foto a Anderson Torres demonstrando que os acampamentos estavam desmobilizados, não havendo motivos para preocupação. Hermeto concluiu que “eles negligenciaram e minimizaram o risco”, mas não viu responsabilidade direta de Torres.
O deputado ressaltou ainda que, durante os atos de 8 de janeiro, as forças de segurança do DF se reportavam ao secretário executivo, já que Anderson Torres estava fora do país naquele momento.
Reunião prévia tentou desmobilizar acampamentos
Ana Paula Marra, ex-secretária de Desenvolvimento Social do DF, forneceu detalhes sobre os esforços para desmobilizar os acampamentos que se formaram em frente ao Quartel-General do Exército. Segundo seu relato, ela foi convocada para uma reunião em 6 de janeiro de 2023, onde Anderson Torres explicou a importância da atuação da assistência social para apoiar pessoas em situação de rua que estavam nos acampamentos.
A ex-secretária afirmou que ficou definido na reunião que sua equipe entraria com abordagem social e que havia “intenção firme e clara de desmobilizar o acampamento”. Ela também relatou ter presenciado Torres discutindo sobre mandados de prisão para líderes dos manifestantes.
Marra ressaltou que só voltou a ser acionada após a prisão de muitas pessoas nos acampamentos, quando o interventor federal Ricardo Capelli solicitou que fornecesse alimentação para os manifestantes detidos na Polícia Federal.
Senador confirma base em relatórios oficiais
Espiridião Amin, senador que participou de reuniões no Bunker do Senado, confirmou que as discussões foram baseadas em relatórios da Polícia Federal e contaram com a participação de representantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).