Na retomada do julgamento de dois recursos que tratam da responsabilidade dos provedores de internet por conteúdo de terceiros e a remoção de postagens ofensivas sem determinação judicial, realizado no plenário do Supremo Tribunal Federal, nesta quarta-feira (18.12), o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, considerou o artigo 19 do Marco Civil parcialmente inconstitucional, porém afirmou ser “legítimo que, em muitas situações, a remoção de conteúdo somente deva se dar após ordem judicial”.
Os relatores dos dois recursos, ministros Dias Toffoli (RE 1037396) e Luiz Fux (RE 1057258/MG), em sessões anteriores, negaram o provimento das ações e defenderam a responsabilização dos provedores, declarando que o artigo 19 é inconstitucional.
Na sessão desta quarta, Barroso divergiu em alguns pontos dos votos dos relatores. Ele considerou o seguinte.
. O artigo 19 é insuficiente, mas não deve ser eliminado. As exceções para aplicação da regra do artigo 21 devem ser ampliadas.
. A responsabilidade por conteúdos de terceiros deve ser subjetiva e não objetiva, em caso de dúvida cabe ao Judiciário decidir.
. As plataformas devem ter o dever de cuidado para mitigar riscos recorrentes de atuação criminosa ou gravemente lesiva à sociedade como pornografia infantil, tráfico de pessoas e terrorismo.
Barroso também defendeu que a remoção, em caso de ofensas em crimes contra a honra, não pode prescindir de decisão judicial. “Conteúdos relacionados à honra, ainda que se alegue que representem crimes de injúria, calúnia ou difamação, devem permanecer na minha visão sob o regime do artigo 19 do Marco Civil da Internet, sob pena de violação à liberdade de expressão”.
Além disso, destacou que as transformações digitais facilitaram a comunicação humana em múltiplas dimensões. Mas reforçou resultados negativos como a possibilidade da circulação sem filtro algum da informação e a crise no modelo de negócios da imprensa profissional.
“Abriu um espaço no mundo para a desinformação, mentiras deliberadas, discursos de ódio, as teorias conspiratórias que repetidamente fazem a vida ficar pior”.
Barroso sustentou que é necessário regular as plataformas de redes sociais, principalmente do ponto de vista econômico e da privacidade.
“Não se trata de limitar a liberdade de expressão, mas de proteger a liberdade de expressão para que ela continue a desempenhar o papel decisivo que tem nas sociedades democráticas.
FUX
Em voto apresentado na semana passada, o ministro Luiz Fux considerou que, mesmo após a lei do Marco Civil da Internet, as empresas continuam isentas de responsabilidade. Segundo o ministro, o Artigo 19 permite que as plataformas fiquem numa “zona de conforto”, em que só podem ser responsabilizadas por conteúdos ilícitos de terceiros após ordem judicial.
“Não se pode negar que a lei do Marco Civil passou por um amplo debate. Acontece que, no meu modo de ver, houve um desvio de ótica”.
O ministro defendeu que, após a notificação, os provedores devem retirar o conteúdo de forma imediata e que as plataformas têm o dever de monitorar casos de discursos de ódio, racismo, pedofilia, incitação à violência e apologia ao golpe de Estado, para a preservação eficiente do Estado Democrático de Direito. Propôs também que os provedores tenham responsabilidade civil se houver lesões a direitos quando há pagamento por impulsionamento de conteúdo.
Toffoli
O relator do outro recurso, ministro Dias Toffoli, considerou inconstitucional o Artigo 19 do Marco Civil da Internet. Ele propôs que passe a valer como regra geral para os provedores de internet o artigo 21 do Marco Civil, que estabelece a retirada do conteúdo após simples notificação extrajudicial. Para ele, a norma deve ser aplicada a conteúdos ilícitos e ofensivos.
Conta falsa e página com ofensas
No (RE 1037396), relatado pelo ministro Dias Toffoli, o Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. questiona decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que determinou a exclusão de um perfil falso da rede social. Já no (RE 1057258/MG), relatado pelo ministro Luiz Fux, o Google Brasil Internet S.A. contesta decisão que o responsabilizou por não excluir do Orkut uma comunidade criada para ofender uma pessoa e determinou o pagamento de danos morais. Nos dois casos, os relatores rejeitaram os recursos apresentados pelas empresas e a repercussão geral foi reconhecida pelo Supremo.
Desfecho adiado
Após o voto de Barroso, o ministro André Mendonça pediu vista. Com isso, o julgamento só será retomado após o recesso forense, a partir de fevereiro do ano que vem.